CONEXÕES ACADÊMICAS
Temas emergentes na visão dos Profissionais da Contabilidade
Conteúdo:
Data: 22/fevereiro/2024
Horário: 16h as 17h30
Local: Ao Vivo no Youtube
Palestrantes:
Ahmad Abu Islaim
Contador formado pela Universidade de São Paulo, com mais de 15 de anos de experiência em grupos multinacionais de grande porte de diversos segmentos, tais como empresas de auditoria externa (Big four), indústria e varejo (KPMG, Grupo Unigel, Grupo Carrefour, CVC e Klabin).
Ricardo Tresso Marcolino
Foi gerente de auditoria independente pela KPMG e possui experiências em empresas de grande porte como Gerente executivo da Controladoria. Também é membro de conselho fiscal. Possu9i a graduação em Administração e em Ciências Contábeis, ambos pela FECAP-Fundação Álvares Penteado.
Moderação: Acadêmico da APC Flávio Riberi
Quase 700 pessoas participaram da palestra "Contabilidade Forense: o papel do contador no combate às fraudes", organizada pela Academia Paulista de Contabilidade-APC em conjunto com o Conselho Regional de Contabilidade do Estado de São Paulo-CRCSP, no dia 16 de outubro de2024, com a participação dos Acadêmicos: Eliane Aparecida Maia, especialista em Controladoria, como moderadora, e Marcelo Alcides Carvalho Gomes, contador forense e examinador de fraudes, como palestrante.
O evento online e gratuito, continua à disposição dos profissionais da Contabilidade no canal do CRCSP no YouTube, valendo pontos no Programa de Educação Continuada do Conselho Federal de Contabilidade-CFC.
As discussões envolveram técnicas de auditoria, análise de dados e o uso de tecnologia para detectar irregularidades financeiras, com a participação dos profissionais, através do chat, que tiveram a oportunidade de interagir diretamente com os palestrantes, enriquecendo seus conhecimentos sobre ferramentas e metodologias aplicáveis ao cotidiano contábil.
A atividade foi dividida em três blocos, sendo que na primeira parte, Marcelo Alcides Carvalho Gomes contou que a trajetória de um processo, até chegar no Judiciário, geralmente envolve divergências - de pai brigando com o filho, entre irmãos ou sócios, por exemplo. "Foram várias dessas situações que me levaram a perceber que o que chegava no Judiciário era o final do caso, uma situação já consumada, e apenas para decisão. Foi a partir dessa observação, que comecei a estudar o tema e fui evoluindo ao longo de quase 40 anos de profissão", disse o palestrante.
Incidente de não conformidade
O palestrante explicou que antes de uma fraude ser investigada, ela é considerada um "incidente de não conformidade". Um incidente de não conformidade pode ocorrer em várias situações, como falhas em processos, violações de políticas internas ou não adesão a regulamentos externos. A identificação precoce desses incidentes é crucial para evitar que eles se tornem fraudes sérias. Por isso é que as organizações devem implementar sistemas de monitoramento e auditoria para detectar comportamentos anômalos ou inconsistências que possam indicar a necessidade de uma averiguação mais aprofundada.
Uma vez que um incidente é reportado, uma equipe de investigação dedicada deve ser formada, composta por profissionais com experiência em compliance e em métodos de investigação. E é nesse ponto que entra a expertise contábil. Esses especialistas são responsáveis por conduzir uma análise detalhada, coletando dados relevantes e entrevistando indivíduos que possam ter informações que ajudem a elucidar a situação. "Só a Justiça pode definir se houve ou não uma fraude. E até a Justiça determinar esse aspecto, para nós, contadores, estamos tratando um incidente de não conformidade".
Parafraseando o professor Antonio Lopes Sá, Marcelo disse: "O profissional da Contabilidade precisa conhecer a fraude para defender-se dela, como também proteger o seu cliente". Em outras palavras, o conhecimento sobre fraudes financeiras é essencial para que os contadores identifiquem comportamentos suspeitos e implementem medidas preventivas. Isso envolve a análise crítica de documentos contábeis, auditorias regulares e a adoção de tecnologia que promova a transparência e a rastreabilidade das transações. "Neste sentido, é crucial que os profissionais da Contabilidade mantenham-se atualizados sobre as legislações e regulamentações que regem sua área, uma vez que o ambiente fiscal e contábil está em constante mudança. Essa formação contínua permite a eles compreenderem melhor os riscos e as novas metodologias utilizadas por fraudadores", alertou o especialista.
Contadores famosos especialistas em fraudes
Exemplos notáveis de contadores que se destacaram na luta contra fraudes incluem nomes como Frank John Wilson (19/05/1887 - 22/06/1970), um executivo do Serviço Secreto dos Estados Unidos e ex-agente do IRS, famoso pela condenação, em 1931, do gângster Al Capone, por evasão fiscal. Após ingressar na unidade de inteligência da Receita Federal, o contador Wilson construiu sua reputação durante a Lei Seca como um agente fiscal extremamente rigoroso e até obsessivo. "Para quem assistiu ao filme 'Os Intocáveis' - história da captura e prisão do Al Capone. No filme, o Frank John Wilson morre, mas a boa notícia é que ele não morreu. Depois da prisão do Al Capone, ele foi o primeiro líder da CIA com experiência em crimes financeiros, chegando ao cargo de diretor do Serviço de Inteligência norte-americano".
Outro exemplo foi o sociólogo Edwin Sutherland (1883-1950), que apresentou em sua monografia "O Crime do Colarinho Branco". Sutherland argumentou que os crimes cometidos por pessoas em posições de poder e status elevado, frequentemente em contextos corporativos e financeiros, eram subestimados pela sociedade e pelo sistema judicial. Ele fez uma clara distinção entre os crimes convencionais, geralmente associados a indivíduos de classes sociais mais baixas, e os crimes do colarinho branco, que envolvem fraude, corrupção, desvio de verbas e outras atividades ilegais perpetradas por pessoas em cargos de confiança.
Esta abordagem despertou uma ampla discussão sobre a natureza do crime e suas consequências sociais. Sutherland enfatizou que esses delitos, embora muitas vezes menos visíveis e considerados moralmente aceitáveis em certas esferas, têm impactos devastadores sobre a sociedade, a economia e a vida das pessoas comuns. Sua obra lançou as bases para que outros estudiosos explorassem como as estruturas sociais e econômicas podiam facilitar ou proteger os infratores de colarinho branco.
Além disso, Sutherland propôs que o crime não deve ser analisado apenas sob a ótica do ato ilegal em si, mas também considerando seu contexto social e as desigualdades que possibilitam sua ocorrência. Essa perspectiva contribuiu para um maior entendimento do papel das instituições e das normas sociais na formação dos comportamentos criminosos. Em 1953, o aluno de Sutherland, Donald Cressey desenvolve um aceno consistente sobre crime organizado e a psicologia do abuso ocupacional, trazendo à tona, inclusive, o conceito do Triângulo de Cressey, uma atribuição dos colegas de trabalho.
Triângulo das Fraudes
Dando continuidade à palestra, Marcelo apresentou para o público o "Triângulo das Fraudes", uma representação que ilustra a inter-relação entre três elementos fundamentais: a oportunidade, a motivação e a justificativa. Esses três componentes atuam em conjunto para facilitar a prática de fraudes em diversos contextos, como financeiro, corporativo ou até mesmo em dados.
A oportunidade refere-se ao acesso e à possibilidade de realizar a fraude, muitas vezes criada por falhas nos controles internos ou processos de supervisão. A motivação diz respeito aos fatores que impulsionam o indivíduo a cometer a fraude, que podem incluir problemas financeiros pessoais, ambição e pressão por resultados. Por último, a justificativa é o racional que o perpetrador constrói para se sentir legitimado em sua ação fraudulenta, como o argumento de que está recuperando um investimento perdido ou que outros já teriam feito o mesmo em sua situação. "Entender o Triângulo das Fraudes é crucial para prevenir e detectar fraudes em organizações. Implementar controles adequados que reduzam as oportunidades, além de criar um ambiente ético que minimize as motivações e questionamentos quanto à legitimidade das ações, são passos essenciais para proteger ativos e promover a integridade nos negócios", aconselhou o especialista.
Portanto, a conscientização sobre os fatores que levam à fraude e a aplicação de estratégias preventivas são vitais para qualquer organização que deseje salvaguardar suas operações e manter a confiança de seus stakeholders.
Deficiência em pesquisa
Na sequência, Marcelo Alcides falou sobre deficiência na pesquisa brasileira sobre fraudes. Segundo ele, das 20 maiores faculdades de Ciências Contábeis do Brasil, apenas uma delas tem um curso formal de Investigação Contábil, que é a Universidade de Brasília-UnB. Depois, ele passou para a evolução do ambiente regulatório no Brasil, a qual tem sido influenciada por uma série de fatores, incluindo o aumento da complexidade das transações financeiras, a globalização e o desenvolvimento tecnológico. “Fato é que as fraudes financeiras têm se tornado mais sofisticadas, exigindo uma resposta mais robusta por parte das autoridades reguladoras”, enfatizou.
A criação de órgãos reguladores como a Comissão de Valores Mobiliários-CVM e o Banco Central do Brasil-Bacen têm sido fundamental na construção de um arcabouço legal que visa prevenir e combater fraudes. A implementação de normas mais rigorosas e o fortalecimento da fiscalização contribuíram para a promoção de um mercado mais transparente e seguro. Um dos avanços significativos foi a adoção da Lei Anticorrupção e a Lei Geral de Proteção de Dados-LGPD, que visam coibir fraudes e proteger os direitos dos cidadãos. A colaboração entre diferentes entidades, como o Ministério Público, as forças policiais e os órgãos de regulação, tornou-se essencial para enfrentar esse desafio.
CTA-30
Outro tema de suma importância suscitado pelo palestrante foi o Comunicado Técnico de Auditoria - CTA 30, que traz orientação aos auditores independentes sobre a abordagem e os impactos na auditoria de demonstrações contábeis de entidades envolvidas em assuntos relacionados a não conformidade ou suspeitas de não conformidade com leis e regulamentos, incluindo atos ilegais ou fraude.
Neste sentido, Marcelo Gomes explicou que, aos contadores, a orientação é adotar práticas de verificação rigorosas, como a análise de documentos e o uso de tecnologia avançada para autenticação, pode significativamente reduzir a incidência dessas fraudes. Além disso, é essencial que as instituições financeiras invistam em treinamentos contínuos para seus colaboradores, capacitando-os a identificar sinais de atividades suspeitas.
Em sua visão, "a colaboração entre auditores, contadores e outras partes interessadas é crucial. A troca de informações e boas práticas pode fortalecer a abordagem de compliance e criar um ambiente mais seguro para prevenção de fraudes, beneficiando assim não apenas as organizações, mas também o mercado como um todo".
Conclusão
Nos minutos finais, o engajamento do público foi evidente, com diversas perguntas e um diálogo aberto que refletiu o interesse e a relevância do tema abordado. O evento promoveu conhecimento e fortaleceu a rede de contatos entre profissionais da área, possibilitando a troca de experiências e o fortalecimento de vínculos que podem resultar em futuras colaborações.
A Acadêmica da APC Eliane Aparecida Maia, moderadora do evento, ressaltou que as palestras da Academia Paulista de Contabilidade têm por objetivo a formação contínua e o aprimoramento dos profissionais contábeis. "Nosso propósito é uma maior conscientização sobre as responsabilidades éticas e legais inerentes à profissão".
"A realização de eventos como este é fundamental para o aprimoramento da classe contábil, contribuindo para a construção de um ambiente de trabalho mais seguro e em conformidade com as melhores práticas de governança e compliance. A Academia Paulista da Contabilidade-APC e o CRCSP demonstraram seu compromisso em promover discussões relevantes e práticas que visam a melhoria constante da profissão contábil", reforçou o presidente da APC, Alexandre Sanches Garcia.
Texto: Danielle Ruas
Edição: Lenilde De Léon
De León Comunicações